Estúdios abrem espaço para artistas independentes

Locais, utilizados para ensaio e gravação, se utilizam de progressos tecnológicos para ampliar o atendimento aos artistas

Raul Zito, sócio do estúdio Caixa de Ovo, que prepara a ampliação

As facilidades à importação de instrumentos e equipamentos nos últimos dez anos têm levado ao aumento do número de estúdios de gravação em Belo Horizonte. Muitos foram criados para atender à demanda do próprio dono, músico, mas que passam a ser alugados para artistas, profissionais ou não. Alguns, para sobreviver no mercado cada vez mais disputado, têm expandindo os negócios à publicidade e às trilhas. E há quem continue investindo e ampliando os negócios.


Vocalista e guitarrista da banda de ska Pequena Morte, Raul Zito conta que montou o estúdio Caixa de Ovo, em 2006, para ter um lugar para ensaiar. “Como a maioria das bandas, ensaiava em estúdio que não era nosso. Cobravam por hora e, quando se completava o período (normalmente, duas horas), cortavam o microfone, desligavam a luz, às vezes no meio de uma ideia. Era uma coisa bem comercial, que estava prejudicando nossa forma de tocar, compor, se expressar”.


Em 2001, Raul Zito e o baterista de sua banda na época resolveram se mudar para Boston (EUA), para tocar na noite e juntar dinheiro à compra de equipamentos necessários para montar um estúdio. Na volta, viram que “um milhão de bandas” queria trabalhar com horário mais folgado, um clima mais íntimo, e nasceu o Caixa de Ovo, primeiro estúdio instalado em Macacos/Nova Lima, e depois no Bairro São Bento, em Belo Horizonte. “Investi muito tempo, criatividade, sociabilidade”, registra Raul Zito, sem revelar cifras.


Os usuários do espaço são artistas independentes que fazem trabalho autoral, ainda que também sejam recebidas bandas cover. Além de alugar para ensaios (R$ 40 por duas horas), o Caixa de Ovo grava, mas exclusivamente, quando há afinidade com o projeto. Deu tão certo que eles vão abrir a segunda sala este ano.


A cantora Elisa Paraíso também investe no setor. Ela montou o Studio 71 há seis anos. Queria um lugar para ensaiar e alugá-lo para amigos da MPB e da música instrumental e também para músicos amadores.


O negócio foi crescendo na propaganda boca-a-boca. A partir do próximo mês, começa a gravar. “O rendimento do estúdio de ensaio não é tão bom, por mais que esteja lotado. No de gravação, o rendimento é muito maior porque, além do período de gravação ser mais prolongado, permite pegar produções de disco e fazer publicidade. Embora hoje em dia haja um estúdio em cada esquina, acho que tem espaço para todo mundo”, considera, calculando que só no Bairro Serra, onde se instala, há quatro ou cinco estúdios.


Elisa enumera as vantagens do ensaio em ambiente propício: “a qualidade do som é muito melhor, todo mundo se escuta, tem uma pessoa por conta do som para ficar bacana, tem bateria montada, amplificadores”, explica ela.


Para a cantora, gravar em estúdio caseiro é uma forma de ter o registro, mas um trabalho com pretensão de tocar em rádio precisa ser feito com profissionais. “Tem gente que capta som em casa e vai para o estúdio tratar para deixar top. Continuo acreditando que vale a pena, a acústica do ambiente influencia – meu estúdio foi todo projetado acusticamente – e a qualidade do microfone faz diferença”.


Leo Moraes, produtor musical e guitarrista da banda Valsa Binária, também resolveu ter seu próprio espaço, o Estúdio Pato Multimídia, em amplo apartamento no Centro de BH. “Todo músico sonha ter estúdio, ter mais autonomia para seu trabalho”, observa Leo Moraes, que produz outros artistas e faz trabalhos de publicidade “que ajudam a sustentar o estúdio”. Ele, que é formado em Arquitetura e especializado em acústica, explica que embora o número de estúdios na cidade seja realmente grande, há “muitos sem estrutura bacana, sem embasamento, sem espaço adequado, sem acústica legal”, registra.


“Quando comecei, muita gente falou para eu não montar estúdio, que muita gente grava em casa, que os softwares estão cada vez melhores. Mas certo tipo de música precisa ter sala boa, equipamentos, compressores, amplificadores que são caros para os usuários domésticos” – pondera o músico, que já teve retorno do investimento inicial de R$ 50 mil.


Leo Moraes é o criador do selo cooperativo Membrana Música, que ajuda artistas independentes na distribuição e difusão dos trabalhos.


Concorrência aumenta e força às adaptações


O produtor, compositor, instrumentista e cantor Flávio Henrique calcula que, quando montou o estúdio Via Sonora, em 1996, havia outros cinco em BH. Hoje, de acordo com o músico, seriam mais de 100, de todos os tipos. “Com formato comercial, que é só estúdio, com infra-estrutura, tem uns 15”, estima ele.


O melhor momento para esse mercado, na avaliação de Flávio Henrique, teria sido há dez anos. “Os estúdios ainda eram poucos e apareceram as leis de incentivo, que aumentaram a produção. Foi uma injeção muito boa de recursos no mercado. Peguei uma época muito boa, não tinha nem como atender tanta gente”.


Já o André Melo, diretor executivo da Serrassônica Produtora de Áudio (empresa surgida em 2000 da união do estúdio Polifonia com a produtora Estúdio B), avalia que agora é o melhor momento para se ter um estúdio.


“O estúdio vivia de aluguel para artista gravar demo. Hoje, a gente grava disco também (principalmente os artistas do selo Serrassônica, casos de Rogermoore, Bluesatan, OscilloID, Iconili, Castilho & Zimun), mas cria mais conteúdo para publicidade, cinema, televisão. Na época, tinha como a empresa sobreviver alugando a estrutura. Hoje, acho impossível, não vale mais a pena”, avalia ele.


A principal mudança nessas duas décadas, na visão de André Melo, é que, antes, qualquer artista que quisesse gravar qualquer coisa, por mais simples que fosse, tinha que ir para o estúdio. Hoje, ele pode fazer por conta própria ou com uma estrutura menor; só procura um estúdio profissional quando vai gravar disco, não gasta dinheiro com demo.


Ele diz que as pessoas começaram a gravar em casa e que demorou alguns anos para os próprios artistas perceberem que, dependendo do gênero, podem fazer uma coisa interessante com estrutura pequena, mas, em muitos casos, não se consegue a qualidade de um bom estúdio.


“Com a internet facilitando um monte de coisa, as pessoas começaram a achar que podiam fazer tudo sozinhas, que eram livres, não precisavam de gravadora. Mas, em vez de ter mil bandas, agora há 100 mil; se não tiver qualidade, ninguém vai querer te escutar. Voltou a importância de fazer a coisa bem feita. A diferença é que antes se gravava em estúdio grande porque não havia opção. Hoje se grava porque se a coisa é caseira ninguém vai escutar”.








Fonte:hojeemdia.com.br

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